A Casa da Baronesa está localizada na Praça Tiradentes, no centro da cidade. A casa foi a residência de uma das mais ilustres famílias que se instalaram em Vila Rica: a família de Manoel Teixeira de Souza (Barão de Camargos) e Maria Leonor Felícia da Rosa (Viscondessa de Camargos).
Foi doada à união em 1941. Atualmente é sede do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) em Ouro Preto.
A Praça Tiradentes
Os símbolos do poder real: o Senado da Câmara, a Casa de Câmara e Cadeia e o Pelourinho formavam um complexo arquitetônico que junto aos prédios públicos mais relevantes, definiria uma nova centralidade em torno á praça.
Para substituir a antiga cadeia de pau-a-pique, o rei de Portugal ordenou, em 1730, a construção de uma nova cadeia de pedra e cal em Vila Rica. Fracassados vários intentos anteriores, o próprio governador da Capitania de Minas Gerais, capitão-general Luís da Cunha Meneses. A partir do projeto de autoria própria deu início á construção no ano de 1785, levando 70 anos para ser concluído.
A construção da Casa de Câmara e Cadeia determinou a duplicação da atual praça Tiradentes, não só com a demolição da primitiva cadeia mas ainda de diversas casas que comprometiam a visibilidade do edifício mais importante da capital. A reconstrução de todo o largo, executada em 1797, por José Ribeiro Carvalhais, veio garantir ao museu um espaço acorde com a sua monumentalidade, uma vez que, juntamente com o prédio do Palácio dos Governadores, compunha o centro cívico de maior poder de decisão da Colônia na época.
Além de ostentar as edificações mais importantes, erguidas com maior apuro arquitetônico, nas suas proximidades concentraram-se as residências mais elegantes, do tipo sobrado, moradia de gente mais abastadas, com muitos e bons cômodos, pátio e agua dentro da própria casa.
Nos primeiros tempos a Praça, situada no topo do Morro de Santa Quiteria compreendia uma área menor, que tinha seu limite nas Ruas Direitas do Ouro Preto e do Antônio Dias e, do lado oposto, a antiga Casa de Fundição, que sofreria varias transformações, para se converter finalmente em Palácio e residência do Governador.
Projetado pelo tenente brigadeiro Jose Fernandes Pinto de Alpoim, na década de 1740, o cenário se completaria com uma sequencia de cinco sobrados geminados. Nas imediações achava-se também instaladas as capelas de Santa Rita dos Presos e a Capela de Santana, anexa ao hospital Santa Casa da Misericórdia, criado pela Irmandade da Misericórdia em 13 de agosto de 1735.
Casa da Baronesa
Na divisa com a Misericórdia, na década de 1780, em esta casa residia o coronel Carlos Jose da Silva, Escrivão/Tesoureiro da Junta da Fazenda, copista do Autos da Devassa e Deputado da Junta da Real Fazenda no século XVIII. Em 1790, ficou viúvo de Dona Inácia Rosa Angélica da Silva, com quem teve 8 filhos. Casou-se novamente com Maria Angélica de Sa e Menezes e teve mais 2 filhos. No recenseamento de 1804, aparece citado como morador da residência na Praça, em companhia dos filhos do segundo casamento, Carlos Manoel e Carlota Camila, e de outras três filhas da falecida esposa.

Apos o falecimento do coronel, a casa continuaria em propriedade de seus familiares ate a primeira metade do século XIX, quando a viúva do coronel Carlos Jose da Silva, vende a propriedade. O comprador foi o comendador Fernando Luís Machado de Magalhaes, Deputado e Tesoureiro Geral da Junta da Fazenda da Província de Minas Gerais e membro da comissão encarregada dos melhoramentos da Santa Casa de Misericórdia, em 1824. Natural de Passagem de Mariana, abastado fazendeiro, era morador antigo da Praça que pagava alugueis a Santa Casa da Misericórdia pela casa de sobrado N°15, propriedade da Misericórdia.

O novo proprietário iniciaria obras de reforma no imóvel, pagando a Joaquim Teodoro da Silva, no mês de marco de 1831, quatro mil e oitocentos reis por 15 carros de pedra e mais 10 carros de pedra no mesmo mês e ano.
O imóvel passaria, por direito de herança e sucessão, a uma das filhas de Fernando Luís Machado de Magalhaes, Maria Leonor Felícia da Rosa que ali viveu com seu marido, Manoel Teixeira de Souza, futuro Barão de Camargos.
Arquitetura do Sobrado Colonial
Construída em dois pavimentos, funcionava como residência no pavimento superior e comércio no pavimento térreo. Com três vãos no pavimento superior e quatro no térreo, além de acesso lateral à área de serviços, posteriormente recebeu complementação no pavimento superior, com mais duas janelas seguindo a tipologia já existente: porta-balcão.
Pela sua arquitetura, é fácil perceber que o pavimento térreo foi feito para funcionar como comércio. Nele existem a pórta e duas janelas alias do acesso lateral à área de serviços, atual entrada principal da casa.
Restauração e Arqueologia
A edificação foi restaurada, de 2002 a 2006. Em 2007, foi executado projeto paisagístico no quintal, após a realização de prospecção arqueológica. Uma equipe chefiada pela arqueóloga Alenice Baeta, da Artefactto Consultoria, realizou uma grande intervenção arqueológica para revitalização e reutilização do jardim da Casa da Baronesa.
O projeto, subsidiado pelo Programa Monumenta, possibilitou a evidenciação de estruturas antigas da Casa da Baronesa, como muros de arrimo, pisos e canalizações, ruínas da antiga Santa Casa de Misericórdia.
A casa permaneceu com a família do Barão de Camargos ate 1941, quando e doada para a União. Atualmente funciona como Sede do Escritório Técnico do IPHAN em Ouro Preto, instituicao responsavel por sua guarda definitiva.
Os Casamentos no Brasil Imperial
A maioria da população tinha dificuldades em atender às exigências burocráticas e financeiras do matrimônio eclesiástico. O casamento era relativamente escasso. A união oficial praticamente se restringiu à elite branca ligada à terra, ao comércio ou aos cargos públicos.
Os casamentos entre as famílias nobres foram usados como estratégias capazes de ligar importantes núcleos familiares, objetivando a manutenção e aumento da riqueza da elite colonial. Já a obtenção de títulos de nobreza, outro estratagema amplamente usado pelas famílias do Império, garantia o prestígio social tão caro às elites do século XIX.
Os casamentos realizados entre as classes abastadas visavam à criação ou estreitamento de vínculos familiares proveitosos a ambos os núcleos, enquanto que a obtenção de títulos de nobreza funcionava como um forte atrativo para que a família que os possuíssem tivessem noivos mais facilmente elegíveis por outras famílias da classe senhorial.
Machado de Magalhães e Teixeira de Souza
Em fins do ano de 1830, dois notáveis dois famílias afastadas da elite ouro-pretana tomavam a decisão de unir suas famílias: Machado de Magalhães e Teixeira de Souza. Ambas as duas famílias tinham seis filhos. Em janeiro do ano de 1831 a união entre famílias se daria através do enlace matrimonial de Modesto Antônio Machado de Magalhães e Francisca Carolina Teixeira de Souza.
Em 1834, sería a vez de Maria Leonor Felícia da Rosa (13 anos) e Manoel Teixeira de Souza (23 anos), futuros Barao e Baronesa de Camargos. A disparidade etária não era mal vista pela sociedade, nem em princípios do século XIX, quando o que importava era a aliança econômico-social que o matrimônio acarretava.
Enquanto a fonte de riqueza dos Machado de Magalhães estava concentrada na posse de terras, a dos Teixeira de Souza encontrava-se no comércio e na posse de várias casas em Ouro Preto. A diversificação dos negócios familiares permitiu, em grande parte, que as fortunas se ampliassem e se consolidassem. O casamento de Manoel e Maria Leonor, uniria a posse da terra pertencente à família da esposa, à atuação na política por parte do marido.
Como chefe do partido conservador em Minas Gerais, Manoel Teixeira de Souza atuou por vários anos em importantes cargos, tais como deputado provincial e geral, vice-presidente da província de Minas Gerais, com exercício em sete períodos. Foi também senador do Império, atuando na corte do Rio de Janeiro até o ano de sua morte, em 1878. Alguns dos grandes feitos promovidos por este ilustre ouropretano foram a criação da Escola de Minas, juntamente a Henri Gorceix, o ramal férreo para Ouro Preto e o Tribunal de Relação de Ouro Preto.
Como reconhecimento no ano de 1871, Dom Pedro II lhe concede para ele o título de Barão de Camargos. Quando um homem casado recebia uma mercê honorífica, sua esposa também passava a usar e a responder pelo título, por empréstimo do marido, uma vez que apenas ele, e não o casal, o havia recebido. Maria Leonor que, após o recebimento do título de barão pelo seu cônjuge, passa a usá-lo também. Mesmo com a morte do barão no ano de 1878, a sociedade continua a reconhecer sua esposa como baronesa.
Quando o dia 30 de março de 1881, chegava à cidade de Ouro Preto a tão esperada comitiva Imperial, na qual, além de D. Pedro II e da Imperatriz Teresa Cristina, constavam outros tantos funcionários imperiais, o próprio Pedro II decidiu agraciá-la com o título hierarquicamente superior ao de baronesa, ou seja, o de Viscondessa de Camargos.
A Grande Família
A família aumentaria progressivamente nas décadas de 1850 e meados de 1860, quando o casal teria seu décimo quinto e último herdeiro, a menina Joana Teixeira de Souza Magalhães, nascida em 1865. Depois de constituída tão numerosa família, cabia aos pais a criação e a educação dos filhos, bem como a escolha dos pares a quem seus herdeiros se uniriam através do sagrado sacramento do matrimônio. Desta forma, não é de se estranhar que a família do barão e baronesa de Camargos tenha elegido outros filhos de barões para se unirem a seus herdeiros, o que demonstra uma preocupação na manutenção e aumento do prestígio deste grupo familiar.
A filiação a uma irmandade religiosa era determinante. Por outra parte, as meninas eram ensinadas a bordar, costurar, rezar e cozinhar, enfim, a desempenharem todas as funções necessárias a uma boa esposa, mãe e dona de casa. As moças cresciam, assim, com uma espécie de idéia fixa pelo casamento, querendo que este ocorresse o quanto antes, pois eram a todo o momento assombradas pela possibilidade de ficarem solteiras.
A formação e instrução dos homens da familia era um fator fundamental. Três, dos quatro filhos dos barões de Camargos eram diplomados, os quais se uniram a cobiçadas filhas de outros barões do Império, O primogênito, Manuel Teixeira de Souza, bacharel em Direito pela Faculdade de São Paulo, Juiz de Direito em Ponte Nova, casou-se com Maria Monteiro de Castro, filha dos barões de Congonhas. O diplomado em Direito pela Faculdade de Recife, Fernando Teixeira de Souza Magalhães, agregava as qualidades de ter servido como secretário do governo provincial e como deputado na assembléia geral, abandonando, porém, muito jovem a carreira política para dedicar-se à sua fazenda em Mercês do Pomba e à poesia. Casou-se com Ana Baeta Neves, filha dos barões de Louredo. Era também filha dos barões de Louredo, Amélia Baeta Neves, que se casara com o Coronel José de Calazans Teixeira de Souza Magalhães. Por fim, o outro filho de Manoel e Maria Leonor a desposar a filha de ilustres barões foi o engenheiro Lucas de Souza Magalhães, o qual se destacou ao trabalhar no projeto do prolongamento da Estrada de Ferro Dom Pedro II. Casou-se com Cândida Flora de Queirós, filha dos barões de Santa Cecília.

O casamento funcionava como uma importante estratégia de união de riquezas e prestígio social. Os dotes recebidos pelas filhas das famílias de elite certamente contribuíram para tornar muitas senhoritas mais atraentes aos olhos dos rapazes que pretendiam se casar. A prática de conceder um dote às filhas constava nas leis lusitanas, como um dos deveres do pai. Esta prática européia foi trazida para o Brasil, pelos portugueses, no início da colonização no século XVI. Passando por algumas modificações e adaptações, o dote sobreviveu até o final do século XIX. Ainda no século XVII, o dote cumpriu importante papel no que tange à transmissão de riqueza da família às filhas, assim como o favorecimento destas em relação aos filhos homens da família, os quais eram impulsados a procurar bons casamentos.
No dia 18 de maio de 1867, por ocasião de seu matrimônio com o primo Fortunato Teodoro Ferreira Bretas, a filha do barão e da baronesa de Camargos, Antônia Joaquina Teixeira de Sousa, receberia o dote no valor de 7:606$000 (sete contos seiscentos e seis mil réis). Menos de um mês depois do casamento de Antônia, Manoel Teixeira de Souza despenderia mais uma considerável soma de sua fortuna para dotar outra filha. Maria Leonor Teixeira casou-se no dia 04 de junho de 1867 com Lourenço Baeta Neves.
Efetivamente, confirmando uma vez mais, que a família Teixeira de Souza Magalhães, assim como diversas outras famílias mineiras de elite, usou dos matrimônios entre famílias notáveis como forte estratégia de manutenção de seu status social e riqueza, no dia 17 de abril do ano de 1869, ocorre mais uma união desta com a família Baeta Neves. Os nubentes, desta vez, eram Francisca Teixeira de Souza e Antônio Pedro Baeta Neves, irmão do acima citado Lourenço Baeta Neves.
Depois da morte do barão de Camargos, em 21 de agosto de 1878, a viscondessa de Camargos permaneceu viúva por 24 anos, vendo a falecer no ano de 1902 na cidade de Florença na Italia aos 87 anos de edade.
fonte:
- As ruínas soterradas do Morro de Santa Quitéria: Ouro Preto antes da Inconfidência Mineira – Henrique Pilo, Alenice Baeta, Rosa Basilio, Vanessa Braide (1)
- Cartas à Viscondessa: cotidiano e vida familiar no Brasil Império (Ouro Preto, 1850 – 1902) – Amanda Dutra Hot (2)
- http://portal.iphan.gov.br/mg/pagina/detalhes/1280